O escritório Jaime Lerner Arquitetos com atenção especial na importância da água para evitar alagamentos e enchentes nos projetos urbanos

O olhar de Jaime Lerner sobre a água

Jaime Lerner, um dos urbanistas e arquitetos brasileiros mais respeitados no mundo, dizia ser preciso “desenhar com a água”.

Quem nos conta isso é Débora Ciociola, umas das arquitetas que lidera o escritório Jaime Lerner Associados que dá continuidade a muitos dos ensinamentos deixados por ele.

Foi a partir desse conceito que Lerner criou um dos projetos urbanos mais eficientes do país e que até hoje é considerado um modelo a ser seguido: a cidade de Curitiba.

A tônica dada às suas criações, desde a década de 70, se mostra mais necessária do que nunca.

Os recentes problemas causados pelas alterações climáticas e o volume anormal de chuva em todo o território brasileiro, vêm trazendo luz à questão que deve se tornar prioritária em se repensar o planejamento das cidades.

Projetos de urbanismo bem sucedidos, como os desenvolvidos até hoje pelo escritório de Lerner, partem de uma base ambiental que começa pelo estudo do comportamento fluvial e pluvial das áreas onde os empreendimentos são inseridos.

“Desenvolvemos este trabalho com ênfase na comunhão com a geografia do lugar, buscando integrar os aspectos naturais às soluções urbanas”, comenta Débora.

Segundo a urbanista “a permeabilidade do solo nos lotes, praças e parques favorece a formação de um mosaico verde que se espalha por toda a área urbanizada, inclusive nas calçadas com jardins de chuva, canteiros que retêm temporariamente a água, diminuindo a pressão sobre as galerias pluviais convencionais”, explica.

No viés público, a excelência do urbanismo de Lerner resultou na qualidade de vida que até hoje é realidade para os moradores de Curitiba.

Os muitos parques e áreas verdes da capital paranaense desempenham um papel maior do que o lazer, protegendo o leito dos rios e funcionando com contentores para cheias causadas por chuvas fortes.

No viés privado, entretanto, ainda há muito o que avançar, especialmente onde há maior densidade populacional e alta valorização imobiliária.

Entre os poucos empreendimentos de grande porte com real compromisso ambiental no país, o Vivapark Porto Belo é um exemplo a ser seguido. Localizado na região que concentra as cidades de metro quadrado mais caro do Brasil, o projeto idealizado por Jaime Lerner é uma espécie de oásis em meio ao mar de concreto e arranha-céus da redondeza.

“O olhar de Lerner enxergou o futuro”, reflete Mônica Volaco, vice-presidente da Vokkan, empresa desenvolvedora do projeto.

“Temos o privilégio de continuar e materializar seu legado neste empreendimento, mas esperamos que essa premissa seja ainda mais difundida. O resultado é uma vida mais harmoniosa, sem agredir a natureza e tampouco ser agredido por ela”, comenta Mônica.

Planejado com base ambiental desde a concepção inicial, o empreendimento mantém intactos 138 mil m² de área verde, fazendo dele o primeiro bairro parque do país. As enchentes e problemas causados pelas chuvas são comuns na região, mas não serão realidades nas ruas do Vivapark em razão do trabalho cuidadoso da equipe de urbanistas.

“A região possui um terreno plano, no nível do mar e com lençol freático aflorado. Tivemos uma atenção ainda maior em relação à presença da água ao desenhar o bairro”, comenta Débora.

Curitiba e o Vivapark Porto Belo, avalia a arquiteta, têm soluções similares para problemas que podem ser causados pelo crescimento que não respeita os cursos naturais d’água.

“O conjunto funciona como um grande sistema de absorção da água da chuva, integrado à paisagem urbana”, diz.

“Pensamos numa solução sistêmica e integrada em que diversas áreas permeáveis pudessem absorver a água, além de um grande parque verde central com uma lagoa de contenção para onde o excesso de água é conduzido”.

A vegetação como aliada

A vegetação é outro elemento central na concepção do bairro catarinense, uma vez que a cobertura vegetal consegue reter parte da água das chuvas, que chegará posteriormente aos lençóis freáticos e rios.

A paisagista Juliana Castro, do escritório JA8 Arquitetura Viva, enxerga nas plantas nativas da região o grande trunfo para compor o melhor cenário.

“São espécies melhor adaptadas ao microambiente”, diz. No Vivapark, a arborização é composta por plantas nativas da Mata Atlântica, o bioma predominante na costa brasileira.

“Incorporar esses elementos naturais é parte do processo de compreensão do meio. Vai além do propósito ornamental do paisagismo, pois também desempenha um papel ecológico”, comenta Juliana.

Redução de desperdício de água

O aproveitamento correto da água também é uma das premissas do planejamento do Vivapark Porto Belo, segundo Mônica Volaco.

“Dados apontam para um desperdício de mais de 39% da água potável no Brasil”, lembra a executiva, referindo-se a dados divulgados pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) em 2019.

Boa parte desse volume é perdido devido à precariedade da infraestrutura de saneamento do país, “isso não é apenas responsabilidade do poder público, são escolhas feitas por empresa privadas em seus próprios empreendimentos” afirma a executiva.

No Vivapark Porto Belo foram feitos investimentos em um sistema de tubulação de Polietileno de Alta Densidade que pode mitigar expressivamente o nível de desperdício, explica.

Além disso, todas as casas e empreendimentos do bairro são estimulados a cumprir alguns critérios tidos como essenciais para o manejo adequado dos recursos hídricos. “A captação da água da chuva, por exemplo, é uma medida simples e de baixo custo que gostaríamos de ver em todas as casas e edifícios” conta Mônica.

O cuidado ambiental no Vivapark Porto Belo fez dele o primeiro projeto do mundo a atingir o nível platinum no selo LEED for Communities: Plan and Design a principal certificação global de sustentabilidade e qualidade de vida.

“Precisamos repensar nossas cidades e o tipo de vida que queremos ter e oferecer às próximas gerações. Pensar na água e tudo o que envolve um ambiente urbano são questões prioritárias e devem ser debatidas no âmbito individual, público e também privado. Espero que o Vivapark seja apenas o início de novos modelos de urbanismo não só em Santa Catarina, mas em todo o país”, conclui Mônica.

Contato:
Jaime Lerner Arquitetos Associados
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