O Coletivo Levante construiu o “Barraco do Kdu” sobre tijolos expostos, elementos de autoconstrução das favelas, sem reboco e pintura

Construção popular mineira é destaque internacional

A melhor casa de 2022 é brasileira e, diferentemente do esperado, é uma construção com 66 m² chamada de a Casa do Pomar no Cafezal.

Segundo o Prêmio ArchDaily Building of the Year 2023, divulgado nesta quinta-feira (23/02/23), o melhor projeto arquitetônico residencial do ano está localizado no Aglomerado da Serra, na periferia de Belo Horizonte (MG).

Criado pelo Coletivo Levante, formado por arquitetos voluntários e focado na criação de projetos em regiões periféricas e favelas, o projeto foi o único de impacto social e venceu a concorrência de outros 1,6 mil imóveis de países como Vietnã, Índia, Alemanha e México.

Casa popular mineira é destaque internacional

Ao longo das últimas três semanas do concurso, promovido pela publicação, a moradia recebeu 150 mil votos dos leitores, a quem é atribuída a premiação.

“Estou em prantos e não sei nem o que falar. Esse prêmio é para todas as periferias do mundo. Amanhã tem festa na favela”, celebra o arquiteto Kdu dos Anjos.

Segundo o Diretor Nacional de Cultura do Instituto de Arquitetos do Brasil, Luiz Sarmento, construções sociais como a Casa do Pomar exigem mais do arquiteto, cujo desafio de otimizar espaços pequenos e o uso do material via orçamentos reduzidos — geralmente, em torno de R$ 68 mil — é uma atividade que demanda rigor técnico e específico.

“Nesse tipo de empreitada, o projeto e a construção precisam resolver questões como colocar uma esquadria de baixo custo, sem abandonar a potencialidade estética. Assim como mesclar uma série de elementos da autoconstrução das favelas, como o terraço e as paredes de tijolo de bloco cerâmico sem revestimentos, junto aos elementos a uma arquitetura eficiente e de ponta”, disse Sarmento.

Assim, a entrada de luz natural é facilitada, o que gera ventilação cruzada e maior conforto à residência. Além disso, a estrutura de tubulações foi feita de maneira que vazamentos são uma raridade.

De acordo com Sarmento, desde a aprovação da Lei 11.888/2008, a assistência técnica nos projetos de engenharia civil para famílias de baixa renda vem proporcionando projetos como a Casa do Pomar.

“Esta premiação foi uma junção feliz do cliente ter conseguido acessar um escritório de arquitetura, com uma série de estratégias para buscar financiamento.

Isso, respeitando o espaço da favela, pois a casa é muito diferente e qualificada das demais construções, mas não é um objeto alienígena e não cria um escândalo na paisagem”, afirmou.

Segundo Kdu dos Anjos, o projeto de edificação da casa iniciou-se em 2017. Com o arquiteto Fernando Maculan, o artista criou o chamado “Coletivo Levante”, que reúne profissionais, arquitetos, designers, engenheiros, paisagistas, de iluminação, moda e estudantes. Um coletivo com foco na arquitetura na periferia.

Um ponto importante é o uso de tijolos vazados na horizontal, oferecendo maior inércia térmica e paredes mais largas.

“Isso se traduz em um ambiente que vai demorar mais a aquecer quando há temperaturas elevadas e a preservar um pouco mais o clima interno quando está frio”, explica o arquiteto Fernando Maculan, que conduziu a obra com Joana Magalhães no Coletivo.

Algo semelhante é visto com a disposição das janelas e portas que, além de permitir a entrada de luz natural e dar mais luminosidade ao ambiente, geram ventilação cruzada que resfria o ambiente. Já as tubulações aparentes de água ajudam a evitar vazamentos.

“A estrutura do meu barraco fortalece a sustentação do beco inteiro. Popularmente moro na rua Sustenido, beco Jenipapo. Tenho muito que agradecer a muita gente”, encerra Kdu.

Construção popular mineira é destaque internacional

O projeto Casa no Pomar do Cafezal

Localizada numa rua do Serrão sem CEP, água encanada e energia legal, a Casa no Pomar do Cafezal foi construída como o resto do bairro, pelos próprios moradores, e sob a liderança dos arquitetos Fernando Maculan e Joana Magalhães.

Localizada num beco e construída num terreno anguloso de 70m², foram usados modelos estruturais em dois níveis.

É um modelo construtivo que utiliza materiais próprios da periferia, com uma implantação adequada e atenção à iluminação e ventilação, resultando em um espaço com grande qualidade ambiental.

Além das tubulações de água e elétrica aparentes, foram usadas janelas de ferro para ter custo semelhante às outras casas da favela.
Seu diferencial, no entanto, é o uso dos elementos e técnicas para a criação de um espaço que combina sustentabilidade e eficiência aos moradores.

Ficha
Casa Kdu
Projeto: Coletivo Levante
Arquitetos: Fernando Maculan, Joana Magalhães
Área: 66 m²
Local: Belo Horizonte
Início: 2017
Conclusão: 2020
Fotografia: Leonardo Finotti

Contato:
MACh Arquitetos
https://arqbrasil.com.br/25331/mach-arquitetos/
https://www.mach.arq.br/