Preservação de patrimônio histórico abre Seminário: “Olho para o mapa da cidade como quem examinasse a anatomia de um corpo.”

Seminário Olhares Sobre a Cidade

Cicero Alvarez – presidente da Federação Nacional de Arquitetos e Urbanistas (FNA) e Maria Teresa Peres de Souza – presidente do Sindicato dos Arquitetos no Estado do Rio Grande do Sul (Saergs) / Cicero Antônio Almeida – museólogo e professor

Ao citar o poeta gaúcho Mário Quintana, o museólogo e professor Cicero Antônio Almeida propôs reflexões sobre as políticas públicas para o patrimônio histórico do Brasil e a memórias das cidades. Sua apresentação abriu a programação de palestras da segunda edição do Seminário Olhares Sobre a Cidade, que ocorreu na terça-feira (30/10), reuniu cerca de 130 pessoas no Memorial Luiz Carlos Prestes, em Porto Alegre (RS).

No início do evento, a presidente do Sindicato dos Arquitetos no Estado do Rio Grande do Sul (Saergs), entidade que promove o evento, Maria Teresa Peres de Souza, lembrou da importância de discutir os aspectos da preservação de obras históricas no país. “O patrimônio só se perde uma vez. Não tem como resgatar algo que se perdeu”, afirmou.

Para Maria Teresa, os problemas das cidades não devem ser constatados apenas por arquitetos, mas, sim, por toda a sociedade. Em concordância, o presidente da Federação Nacional de Arquitetos e Urbanistas (FNA), apoiadora do evento, Cicero Alvarez, citou que esse trabalho deve ser construído com outras entidades, movimentos e pessoas. “Acredito que, acima de tudo, o objetivo desse momento é comentar o nosso olhar sobre uma pauta que não é mais só nossa”, destacou.

Em sua apresentação, Almeida mostrou exemplos de obras históricas que sofreram com o descaso e os entraves dos órgãos públicos, destacando o Museu Nacional do Rio de Janeiro que, recentemente, sofreu um incêndio que destruiu seu acervo logo após completar 200 anos de existência.

Para o museólogo, outros dois incêndios simbólicos ocorreram na sequência: a extinção do Instituto Brasileiro de Museus e, depois, o indicativo de extinção do Ministério da Cultura. “Um dos fatores dessa problemática é imaginar a possibilidade de transigir melhor com as medidas de intervenção nos prédios tombados, visando a prevenção contra incêndios”, afirmou.

Nesse sentido, sua participação no evento foi uma forma de informar o que está acontecendo no Rio de Janeiro, para que a tragédia não caia no esquecimento. “O meu medo é que a gente entenda que acabou, mas não. Essa é uma fase de gestão de riscos”, afirmou, destacando o trabalho que vem sendo feito no sentido de recuperar a memória do local e desenvolver projetos de prevenção contra incêndios em edificações de patrimônios históricos, além da reação coletiva em prol do Museu, demonstrando preocupação com a obra. “Essa reação nos faz refletir: como aquele local com tanto apreço pela sociedade, foi desprezado a esse ponto?”, questionou Almeida.

Conforme destacou o arquiteto e urbanista e também diretor do Saergs, Eduardo Hahn, debatedor da mesa, a realidade do Rio de Janeiro é a realidade de Porto Alegre, de São Paulo e também de pequenas cidades do interior do Rio Grande do Sul. Para ele, há uma incoerência na escolha de investimentos na área de patrimônio cultural. “Temos escolhas em investimentos, em projetos que recebem milhões de reais e outras estruturas que não recebem nada”, afirmou, usando de exemplo o Museu Nacional.

“É um símbolo da forma como o patrimônio é tratado a nível nacional”. Como saída dessa realidade preocupante, Hahn afirmou que o ideal é que se construa, naturalmente, um movimento de preservação, que não seja imposto. “Educação é a chave. Não adianta apenas discutir esses aspectos dentro das universidades”, concluiu.

A iniciativa tem patrocínio do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio Grande do Sul (CAU/RS) e apoio da Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (AsBEA RS), Associação de Arquitetos de Interiores do Brasil/RS (AAI Brasil/RS), Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB RS), Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas (FNA) e Memorial Luiz Carlos Prestes.

Regulação urbana e rural merece atenção na construção das cidades – A produção das cidades é uma escolha sistematicamente construída ao longo dos anos, e os profissionais de Arquitetura e Urbanismo têm parte nesse processo, nos projetos e trabalhos que desenvolvem. É o que afirmou o Coordenador Regional para a Região Sudeste do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico, Patryck Carvalho, em sua apresentação no Seminário Olhares Sobre a Cidade, que ocorreu nessa terça-feira (30/10), no Memorial Luiz Carlos Prestes, em Porto Alegre (RS). A conversa foi mediada pelo arquiteto e urbanista e também dirigente do Sindicato dos Arquitetos no Estado do Rio Grande do Sul (Saergs), André Huyer.

O arquiteto e urbanista abordou questões que envolvem a Lei 13.465/2017, que trata da regulação urbana e rural. Para Carvalho, o que é convencionado como cidade é uma parcela muito pequena do que ela verdadeiramente é. “E é essa pequena parcela que consome quase a totalidade dos recursos públicos”, alertou. Os investimentos e orçamentos devem ser mapeáveis e mapeados, para ele, pois a sociedade deve saber em quais partes das cidades estão sendo inseridos.

Atualmente, segundo Carvalho, há uma transferência do patrimônio público para os interesses privados, o que enfraquece as políticas de habitação. O arquiteto e urbanista avalia que essas políticas públicas não existem no sentido de garantir a propriedade, mas, sim, o direito à moradia. “Precisamos superar a questão de achar que a minha garantia é ter a minha casa. A garantia é ter a política pública de ter a casa, de ter o morar”, destacou.

Nesse sentido, o coordenador citou a arquiteta e urbanista Ermínia Maricato, que convencionou o termo “alfabetização urbanística” como forma de aproximar a sociedade da construção das cidades. “Precisamos retirar a discussão desse círculo restrito e especializado, e pensar as cidades para além dos espaços privados”, afirmou Carvalho.

Construir cidades passa pelo uso de espaços públicos – Pensar e promover o uso dos espaços públicos como forma de resgatar o sentimento de pertencimento da sociedade com as suas cidades. Esse foi o tema da apresentação do arquiteto e urbanista Leonardo Brawl, membro do coletivo independente Translab.urb, que fechou a manhã de palestras do Seminário Olhares Sobre a Cidade promovido pelo Sindicato dos Arquitetos no Estado do RS (Saergs). A palestra, ocorreu no Memorial Luiz Carlos Prestes, em Porto Alegre (RS), e foi mediada pela arquiteta e urbanista e também diretora do Saergs, Jéssica De Carli.

Para o palestrante, coletivos que atuam de forma independente, como o Translab.urb, que já atua há sete anos em Porto Alegre, colocam em xeque as questões habituais de abrir uma empresa, ter CNPJ ou fundar uma associação. “Temos que nos organizar profissionalmente e questionar as maneiras clássicas de organização. Isso também é usar a cidade como local de experimentação”, afirmou. Segundo o arquiteto e urbanista, há quatro setores principais de formação das nossas cidades: a sociedade civil, o setor privado, a academia e a administração pública.

Promover a intersecção entre eles, para Brawl, e articular uma produção distribuída das cidades, é a chave para uma organização coletiva e inteligente. “As conexões verticais e centralizadas se esgotaram, chegaram ao limite”, afirmou. Bem comum, pós-capitalismo, participação, transparência, plurinacionalidade, feminismos, tecnopolítica, municipalismo, sustentabilidade e cultura aberta são alguns dos conceitos que estão dentro dessa produção, segundo o arquiteto e urbanista, que ainda citou alguns dos trabalhos realizados pelo Translab.urb, como a Rua Para Pessoas, a Wikipraça e o Hackerativismo Urbano. “Nós quase não buscamos autorização para testar os espaços públicos. Queremos questionar: é público mesmo?”, destacou.

Contatos:
Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas / FNA
(61) 3347-8889 / (51) 3024-0626
http://www.fna.org.br/

Sindicato dos Arquitetos no Estado do RS / Saergs
(51) 3224-6066
http://saergs.org.br/