Olhe pela janela e reflita: sua cidade tem gênero? Se você não sabe a resposta, é bom pensar sobre ela.

Cidades para as mulheres são cidades para todos

Quase a totalidade das cidades brasileiras são reflexo do pensamento, das tendências e de uma política excludente e machista. Os espaços públicos, e até os privados, reproduzem a marca da supremacia masculina, e está na hora de mudar isso. Das linhas dos projetos até questões como segurança pública, é preciso uma visão mais feminista do mundo que nos cerca. Porque uma coisa é certa: “cidades boas para mulheres são excelentes para todos, seguras para todos”. A reflexão é da secretária geral da FNA e arquiteta e urbanista feminista, Fernanda Lanzarin. Assim como ela, há uma legião de mulheres engajadas em melhorar essa situação.

É o que acredita a arquiteta e urbanista e ativista do movimento feminista Tainá Reis de Paula. Formada pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e mestre em Urbanismo pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Tainá afirma que ser mulher na sociedade atual é um ato político. “As cidades são regidas e governadas por homens, e isso reflete diretamente na vida das mulheres”, diz, e questiona como seriam as cidades se, desde o princípio, fossem lideradas por ícones femininos. “Medidas como o vagão de trem feminino, o que chamamos de apartheid de gênero, não foram projetadas por mulheres”, critica.

Integrante da Partida Feminista, coletivo feminista nacional, Tainá coordena o Projeto Brasil Cidades no estado do Rio de Janeiro, iniciativa liderada pela arquiteta e urbanista Ermínia Maricato, e presta assistência técnica para o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), também no RJ. Negra e periférica, mãe de Aurora, de três anos, desde sempre problematizou a gestão e criação das cidades, o que a inspirou a seguir carreira na profissão. “Eu morei em um loteamento informal e sempre me incomodou o fato de morar no Rio de Janeiro, mas não pertencer ao Rio de Janeiro”.

A partir do seu engajamento, Tainá começou a tensionar, cada vez mais, o seu trabalho com a causa feminista. Uma das principais pautas dentro do contexto profissional é a necessidade de garantir que mulheres assumam a responsabilidade técnica dos seus projetos. “Existe muita misoginia e machismo nos escritórios. Os homens assinam projetos no lugar das mulheres”, denuncia. Além disso, para ela, é fundamental usar referências femininas nas produções técnico-conceituais, e fugir do hábito de citar homens repetidas vezes. “Temos de treinar o olhar acadêmico para as assimetrias de gênero”, conclui.

A desigualdade de gênero não se detém apenas às referências, mas também reflete no corpo docente das faculdades, como nota a arquiteta e urbanista gaúcha Paola Maia Fagundes. Militante na luta pela moradia social e co-fundadora do escritório AH! Arquitetura Humana, Paola afirma que a quantidade de professores sempre foi superior à de professoras durante o seu curso na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Segundo ela, esse era um dos fatores de não levar sua filha Antonella, atualmente com oito anos, para as aulas e locais de trabalho. “Depois que comecei a atuar, vi a importância da mulher nos movimentos sociais. São mães que levam os filhos para a luta, para o trabalho”, cita.

A arquiteta e urbanista ainda reconhece a diferença que homens e mulheres carregam nas tomadas de decisões dentro do ambiente de trabalho. “Já aconteceram reuniões com várias mulheres presentes e só um homem, e ele conseguiu falar mais do que todas elas”, lembra. Para combater a desigualdade cotidiana, Paola afirma que é a autoimposição é um processo automático para adquirir respeito. “É natural agir na defensiva”, afirma.

Essa postura de mulher forte e bem posicionada é uma característica que a arquiteta e urbanista Thais da Silveira leva em seus 24 anos de atuação. Graduada pelo Centro Universitário Ritter dos Reis (Uniritter) e integrante da Casa Veloso, espaço de coworking em Porto Alegre (RS), Thais conta que é acostumada a trabalhar em obras. “Sempre tentei não criar relação de superioridade com os operários”, diz, lembrando que essa conduta a ajudou a manter o respeito nos ambientes de trabalho. No que se refere à sua atuação como arquiteta e urbanista, Thais afirma ter como foco a arquitetura para “clientes normais”, desmistificando o imaginário de que arquitetura existe apenas para pessoas ricas. “Consigo provar que é um serviço acessível”.

Serviço:
FNA – Federação Nacional dos Arquitetos e Urbanistas
(51) 3024-0626
http://www.fna.org.br/

#2018

 

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